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segunda-feira, 3 de março de 2014

Manoel de Barros

"Sou uma mulher cheia de recantos.
Os desvãos me constam
Tem hora leio avencas.
Tem hora, Proust.
Ouço aves e Beethovens."


Manoel de Barros

terça-feira, 16 de julho de 2013

Gorjeio - Manoel de Barros, in 'Ensaios Fotográficos'.

Gorjeio

Gorjeio é mais bonito do que canto porque nele se 
inclui a sedução.
É quando a pássara está namorada que ela gorjeia.
Ela se enfeita e bota novos meneios na voz.
Seria como perfumar-se a moça para ver o namorado.
É por isso que as árvores ficam loucas se estão gorjeadas.
É por isso que as árvores deliram.
Sob o efeito da sedução da pássara as árvores deliram.
E se orgulham de terem sido escolhidas para o concerto.
As flores dessas árvores depois nascerão mais perfumadas.

- Manoel de Barros, in 'Ensaios Fotográficos'.

sexta-feira, 31 de maio de 2013

O bandarra - Manoel de Barros

O bandarra

Ele só andava por lugares pobres
E era ainda mais pobre
Do que os lugares pobres por onde andava.
Falou de começo: Quem abandona a natureza entra a
verme.
Aves nutriam por ele deslumbramentos de criança.
Ele sabia o sotaque das lesmas
E tinha um modo de árvore pregado no olhar.
O homem usava um dólmã de lã sujo de areia e cuspe
de aves.
Mas ele nem tô aí para os estercos.
Era desorgulhoso.
Para ele a pureza do cisco dava alarme.
E só pelo olfato esse homem descobria as cores do
amanhecer.

Manoel de Barros

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Manoel de Barros

A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei. Meu fado é de não saber quase tudo. Sobre o nada eu tenho profundidades. Não tenho conexões com a realidade. Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro. Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas). Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil. Fiquei emocionado e chorei. Sou fraco para elogios.

Manoel de Barros

quinta-feira, 7 de março de 2013

Manoel de Barros - O olhar

O olhar

Ele era um andarilho.
Ele tinha um olhar cheio de sol
de águas
de árvores
de aves.
Ao passar pela Aldeia
Ele sempre me pareceu a liberdade em trapos.
O silêncio honrava a sua vida.

Manoel de Barros, do livro "Poemas Rupestres", 2004.




quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Manoel de Barros

É PRECISO TRANSVER O MUNDO

A expressão reta não sonha.

Não use o traço acostumado.

A força de um artista vem de suas derrotas.

Só a alma atormentada pode trazer para a voz um

formato de pássaro.

Arte não tem pensa:

O olho vê, a lembrança revê, e a imaginação transvê.

É preciso transver o mundo.

Isto seja:

Deus deu a forma. Os artistas desformam.

É preciso desformar o mundo:

Tirar da natureza as naturalidades.

Fazer cavalo verde, por exemplo.

Fazer noiva camponesa voar – como em Chagall.

Agora é só puxar o alarme do silêncio que saio por

aí a desformar.


Manoel de Barros - Poesia completa. São Paulo: 2010

sábado, 15 de dezembro de 2012

Manoel de Barros

Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada, a minha aldeia estava morta. Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas. Eu estava saindo de uma festa.

Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado. Preparei minha máquina.
Fotografei esse carregador.

Tive outras visões naquela madrugada. Preparei minha máquina de novo. Tinha um

 perfume de jasmim no beiral do sobrado. Fotografei o perfume. Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.

Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão. Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre.

Por fim eu enxerguei a nuvem de calça. Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com maiakoviski – seu criador. Fotografei a nuvem de calça e o poeta. Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa mais justa para cobrir sua noiva.

Manoel de Barros

quinta-feira, 31 de maio de 2012

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Manoel de Barros - Retrato Quase Apagado em que se Pode Ver Perfeitamente Nada de "O Guardador de Águas"

Retrato Quase Apagado em que se Pode Ver Perfeitamente Nada
de "O Guardador de Águas" 

I

Não tenho bens de acontecimentos.
O que não sei fazer desconto nas palavras.
Entesouro frases. Por exemplo:
- Imagens são palavras que nos faltaram.
- Poesia é a ocupação da palavra pela Imagem.
- Poesia é a ocupação da Imagem pelo Ser.
Ai frases de pensar!
Pensar é uma pedreira. Estou sendo.
Me acho em petição de lata (frase encontrada no lixo)
Concluindo: há pessoas que se compõem de atos, ruídos, retratos.
Outras de palavras.
Poetas e tontos se compõem com palavras.

II
Todos os caminhos - nenhum caminho
Muitos caminhos - nenhum caminho
Nenhum caminho - a maldição dos poetas.

III
Chove torto no vão das árvores.
Chove nos pássaros e nas pedras.
O rio ficou de pé e me olha pelos vidros.
Alcanço com as mãos o cheiro dos telhados.
Crianças fugindo das águas
Se esconderam na casa.

Baratas passeiam nas formas de bolo...

A casa tem um dono em letras.

Agora ele está pensando -

no silêncio Iíquido
com que as águas escurecem as pedras...

Um tordo avisou que é março.

IV
Alfama é uma palavra escura e de olhos baixos.
Ela pode ser o germe de uma apagada existência.
Só trolhas e andarilhos poderão achá-la.
Palavras têm espessuras várias: vou-lhes ao nu, ao
fóssil, ao ouro que trazem da boca do chão.
Andei nas pedras negras de Alfama.
Errante e preso por uma fonte recôndita.
Sob aqueles sobrados sujos vi os arcanos com flor!

V
Escrever nem uma coisa Nem outra -
A fim de dizer todas
Ou, pelo menos, nenhumas.
Assim,
Ao poeta faz bem
Desexplicar -
Tanto quanto escurecer acende os vaga-lumes.

VI
No que o homem se torne coisal,
corrompem-se nele os veios comuns do entendimento.
Um subtexto se aloja.
Instala-se uma agramaticalidade quase insana,
que empoema o sentido das palavras.
Aflora uma linguagem de defloramentos, um inauguramento de falas
Coisa tão velha como andar a pé
Esses vareios do dizer.

VII
O sentido normal das palavras não faz bem ao poema.
Há que se dar um gosto incasto aos termos.
Haver com eles um relacionamento voluptuoso.
Talvez corrompê-los até a quimera.
Escurecer as relações entre os termos em vez de aclará-los.
Não existir mais rei nem regências.
Uma certa luxúria com a liberdade convém.

VII
Nas Metamorfoses, em 240 fábulas,
Ovídio mostra seres humanos transformados
em pedras vegetais bichos coisas
Um novo estágio seria que os entes já transformados
falassem um dialeto coisal, larval,
pedral, etc.
Nasceria uma linguagem madruguenta, adâmica, edênica, inaugural
- Que os poetas aprenderiam -
desde que voltassem às crianças que foram
às rãs que foram
às pedras que foram.
Para voltar à infância, os poetas precisariam também de reaprender a errar
a língua.
Mas esse é um convite à ignorância? A enfiar o idioma nos mosquitos?
Seria uma demência peregrina.

IX
Eu sou o medo da lucidez
Choveu na palavra onde eu estava.
Eu via a natureza como quem a veste.
Eu me fechava com espumas.
Formigas vesúvias dormiam por baixo de trampas.
Peguei umas idéias com as mãos - como a peixes.
Nem era muito que eu me arrumasse por versos.
Aquele arame do horizonte
Que separava o morro do céu estava rubro.
Um rengo estacionou entre duas frases.
Uma descor
Quase uma ilação do branco.
Tinha um palor atormentado a hora.
O pato dejetava liquidamente ali.

terça-feira, 24 de abril de 2012

Manoel de Barros - A maior riqueza do homem

A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.
Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas,
que puxa válvulas, que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem usando borboletas.


Manoel de Barros

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Manoel de Barros

‎...que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem barômetros etc. 
Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.

Manoel de Barros

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Manoel de Barros

Pegar no espaço contiguidades verbais é o mesmo que pegar mosca no hospício para dar banho nelas. Essa é uma prática sem dor. É como estar amanhecido a pássaros.


Manoel de Barros

Manoel de Barros

Quero apalpar o som da violetas.
Ajeito os ombros para entardecer.
Vou encher de intumescências meu deserto. 



Manoel de Barros

Manoel de Barros

‎"... poesia pra mim é a loucura das palavras, é o delírio verbal, a ressonância das letras e o ilogismo.
Sempre achei que atrás da voz dos poetas moram crianças, bêbados, psicóticos. Sem eles a linguagem
seria mesmal. (...) Prefiro escrever o desanormal."

Manoel de Barros em "Ensaios fotográficos", 2000, p. 63.


publicado por Elfi Fenske

domingo, 1 de abril de 2012

segunda-feira, 26 de março de 2012

Manoel de Barros

No caminho, as crianças me enriqueceram mais do que Sócrates. Pois minha imaginação não tem estrada. E eu não gosto mesmo de estrada. Gosto de desvio e de desver.

Manoel de Barros 

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Manoel de Barros - Poesia

Para entender nós temos dois caminhos:
[o da sensibilidade que é o entendimento
do corpo;
e o da inteligência que é o entendimento
do espírito.
Eu escrevo com o corpo.
Poesia não é para compreender,
[mas para incorporar.
Entender é parede; procure ser árvore.

Manoel de Barros

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Manoel de Barros - Frase

‎Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras: liberdade caça jeito.


Manoel de Barros