O coração tem imbecilidades que a estupidez desconhece.
Millôr Fernandes
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sábado, 17 de novembro de 2012
terça-feira, 17 de abril de 2012
Abecedário - Millôr Fernandes
Abecedário, Millôr Fernandes
O A é uma letra com sótão. Chove sempre um pouco sobre o àcraseado.
O B é um l que se apaixonou pelo 3. O b minúsculo é uma letra grávida.
Ao c só lhe resta uma saída. O ç cedilha, esse jamais tira a gravata.
O D é um berimbau bíblico.
O e minúsculo é uma letra esteatopígia (esteatopígia, ensino aos mais atrasadinhos, é uma pessoa que tem certa parte do corpo, que fica atrás e embaixo, muito feia). O E ri-se eternamente das outras letras.
O F, com seu chapéu desabado sobre os olhos, é um gângster à espera de oportunidade. O f minúsculo é um poste antigo.
A pontinha do G é que lhe dá esse ar desdenhoso. O g minúsculo é uma serpente de faquir.
O H é uma letra duplex. A parte de cima é muda. Serve também como escada para as outras letras galgarem sentido. O h minúsculo é um dinossauro.
O I maiúsculo é guarda, em seu porte de letra, um pouco de número Iromano. O i minúsculo é um bilboquê.
O J, com seu gancho de pirata, rouba às vezes o lugar do g. O jminúsculo é uma foca brincando com sua bolinha.
Vê-se nitidamente: o K é uma letra inacabada. Por enquanto só tem andaimes. Parece que vão fazer um R. Junto com o k minúsculo o Kmaiúsculo treina passo-de-ganso.
O L maiúsculo parece um l que extraíram com raiz e tudo. Mas o lminúsculo não consegue disfarçar que é um número 1 espionando o alfabeto.
O M maiúsculo é um gráfico de uma firma instável. O m minúsculo é uma cadeia de montanhas.
O N é um M perneta. No n minúsculo pode-se jogar críquete com a bolinha do o.
O O maiúsculo é um buraquinho no alfabeto.
O p é um d plantando bananeira.
O Q maiúsculo anda sempre com o laço do sapato solto. O q minúsculo é um p se olhando de costas no espelho.
O R ficou assim de tanto praticar halterofilismo.
Sente-se que o s é um cifrão fracassado. O S maiúsculo é um cisne orgulhoso.
Na balança do T se faz jusTiça.
O U é a ferradura do alfabeto, protegendo o galope das idéias. O uminúsculo é um n com as patinhas pro ar.
O v é uma ponta de lança.
O x é uma encruzilhada.
O Y é a taça onde bebem as outras letras. Desapareceu do alfabeto porque se entregou covardemente, de braços para cima.
O W são vês siameses.
O Z é um caminho mais curto entre dois bares. O z minúsculo é um s cubista.
O A é uma letra com sótão. Chove sempre um pouco sobre o àcraseado.
O B é um l que se apaixonou pelo 3. O b minúsculo é uma letra grávida.
Ao c só lhe resta uma saída. O ç cedilha, esse jamais tira a gravata.
O D é um berimbau bíblico.
O e minúsculo é uma letra esteatopígia (esteatopígia, ensino aos mais atrasadinhos, é uma pessoa que tem certa parte do corpo, que fica atrás e embaixo, muito feia). O E ri-se eternamente das outras letras.
O F, com seu chapéu desabado sobre os olhos, é um gângster à espera de oportunidade. O f minúsculo é um poste antigo.
A pontinha do G é que lhe dá esse ar desdenhoso. O g minúsculo é uma serpente de faquir.
O H é uma letra duplex. A parte de cima é muda. Serve também como escada para as outras letras galgarem sentido. O h minúsculo é um dinossauro.
O I maiúsculo é guarda, em seu porte de letra, um pouco de número Iromano. O i minúsculo é um bilboquê.
O J, com seu gancho de pirata, rouba às vezes o lugar do g. O jminúsculo é uma foca brincando com sua bolinha.
Vê-se nitidamente: o K é uma letra inacabada. Por enquanto só tem andaimes. Parece que vão fazer um R. Junto com o k minúsculo o Kmaiúsculo treina passo-de-ganso.
O L maiúsculo parece um l que extraíram com raiz e tudo. Mas o lminúsculo não consegue disfarçar que é um número 1 espionando o alfabeto.
O M maiúsculo é um gráfico de uma firma instável. O m minúsculo é uma cadeia de montanhas.
O N é um M perneta. No n minúsculo pode-se jogar críquete com a bolinha do o.
O O maiúsculo é um buraquinho no alfabeto.
O p é um d plantando bananeira.
O Q maiúsculo anda sempre com o laço do sapato solto. O q minúsculo é um p se olhando de costas no espelho.
O R ficou assim de tanto praticar halterofilismo.
Sente-se que o s é um cifrão fracassado. O S maiúsculo é um cisne orgulhoso.
Na balança do T se faz jusTiça.
O U é a ferradura do alfabeto, protegendo o galope das idéias. O uminúsculo é um n com as patinhas pro ar.
O v é uma ponta de lança.
O x é uma encruzilhada.
O Y é a taça onde bebem as outras letras. Desapareceu do alfabeto porque se entregou covardemente, de braços para cima.
O W são vês siameses.
O Z é um caminho mais curto entre dois bares. O z minúsculo é um s cubista.
por Millôr Fernandes
``por Millor Fernandes``
O nível de stress de uma pessoa
é inversamente proporcional
a quantidade de
foda-se!
que ela fala.
Existe algo mais libertário
do que o conceito do
foda-se!?
O foda-se!
aumenta minha auto-estima,
me torna uma pessoa melhor.
Reorganiza as coisas. Me liberta.
- Não quer sair comigo ?
Então foda-se!
- Vai querer decidir essa merda
sozinho (a) mesmo?
Então foda-se!.
O direito ao foda-se!
deveria estar assegurado
na Constituição Federal.
Os palavrões não nasceram por acaso.
São recursos extremamente válidos e criativos
para prover nosso vocabulário
de expressões que traduzem
com a maior fidelidade
nossos mais fortes e genuínos sentimentos.
É o povo fazendo sua língua.
Como o Latim Vulgar,
será esse Português Vulgar
que vingará plenamente um dia.
Prá caralho, por exemplo.
Qual expressão traduz melhor a idéia
de muita quantidade do que
Prá caralho?
Prá caralho
tende ao infinito,
é quase uma expressão matemática.
A Via-Láctea tem estrelas
prá caralho,
o Sol é quente
prá caralho,
o universo é antigo
prá caralho,
eu gosto de cerveja
prá caralho,
entende?
No gênero do Prá caralho,
mas, no caso, expressando
a mais absoluta negação,
está o famoso
Nem fodendo!.
O Não, não e não! e tampouco
o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade Não,
absolutamente não! o substituem.
O Nem fodendo
é irretorquível, e liquida o assunto.
Te libera, com a consciência tranqüila,
para outras atividades
de maior interesse em sua vida.
Aquele filho pentelho de 17 anos
te atormenta pedindo o carro
pra ir surfar no litoral?
Não perca tempo nem paciência.
Solte logo um definitivo:
Marquinhos presta atenção, filho querido,
Nem fodendo!.
O impertinente se manca na hora!
Por sua vez,
o porra nenhuma!
atendeu tão plenamente as situações
onde nosso ego exigia
não só a definição de uma negação,
mas também o justo escárnio
contra descarados blefes,
que hoje é totalmente impossível imaginar
que possamos viver sem ele
em nosso cotidiano profissional:
ele redigiu aquele relatório sozinho
porra nenhuma!.
O porra nenhuma,
como vocês podem ver,
nos provê sensações
de incrível bem estar interior.
É como se estivéssemos
fazendo a tardia e justa denúncia pública
de um canalha.
São dessa mesma gênese os clássicos
aspone, chepone, repone
e mais recentemente, o prepone
- presidente de porra nenhuma.
Há outros palavrões igualmente clássicos.
Pense na sonoridade de um
Puta-que-pariu!,
ou seu correlato
Puta-que-o-pariu!,
falado assim, cadenciadamente,
sílaba por sílaba...
Diante de uma notícia irritante qualquer
puta-que-o-pariu!
Dito assim te coloca outra vez em seu eixo.
Seus neurônios têm o devido tempo e clima
para se reorganizar e sacar a atitude
que lhe permitirá dar um merecido troco
ou o safar de maiores dores de cabeça.
E o que dizer de nosso famoso
vai tomar no cu!?
E sua maravilhosa e reforçadora derivação vai
tomar no olho do seu cu!.
Você já imaginou o bem
que alguém faz a si próprio
e aos seus quando,
passado o limite do suportável,
se dirige ao canalha de seu interlocutor
e solta:
Chega!
Vai tomar no olho do seu cu!.
Pronto,
você retomou as rédeas de sua vida,
sua auto-estima.
Desabotoa a camisa e sai a rua,
vento batendo na face,
olhar firme, cabeça erguida,
um delicioso sorriso de vitória
e renovado amor íntimo nos lábios.
E seria tremendamente injusto
não registrar aqui
a expressão de maior poder de definição
do Português Vulgar:
Fodeu!.
E sua derivação mais avassaladora ainda:
Fodeu de vez!.
Você conhece definição mais exata,
pungente e arrasadora
para uma situação
que atingiu o grau máximo imaginável
de ameaçadora complicação?
Expressão, inclusive, que uma vez proferida
insere seu autor
em todo um providencial contexto interior
de alerta e autodefesa.
Algo assim como quando você está dirigindo bêbado,
sem documentos do carro
e sem carteira de habilitação
e ouve uma sirene de polícia atrás de você mandando você parar:
O que você fala?
Fodeu de vez!.
Liberdade, igualdade, fraternidade e
foda-se!
O nível de stress de uma pessoa
é inversamente proporcional
a quantidade de
foda-se!
que ela fala.
Existe algo mais libertário
do que o conceito do
foda-se!?
O foda-se!
aumenta minha auto-estima,
me torna uma pessoa melhor.
Reorganiza as coisas. Me liberta.
- Não quer sair comigo ?
Então foda-se!
- Vai querer decidir essa merda
sozinho (a) mesmo?
Então foda-se!.
O direito ao foda-se!
deveria estar assegurado
na Constituição Federal.
Os palavrões não nasceram por acaso.
São recursos extremamente válidos e criativos
para prover nosso vocabulário
de expressões que traduzem
com a maior fidelidade
nossos mais fortes e genuínos sentimentos.
É o povo fazendo sua língua.
Como o Latim Vulgar,
será esse Português Vulgar
que vingará plenamente um dia.
Prá caralho, por exemplo.
Qual expressão traduz melhor a idéia
de muita quantidade do que
Prá caralho?
Prá caralho
tende ao infinito,
é quase uma expressão matemática.
A Via-Láctea tem estrelas
prá caralho,
o Sol é quente
prá caralho,
o universo é antigo
prá caralho,
eu gosto de cerveja
prá caralho,
entende?
No gênero do Prá caralho,
mas, no caso, expressando
a mais absoluta negação,
está o famoso
Nem fodendo!.
O Não, não e não! e tampouco
o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade Não,
absolutamente não! o substituem.
O Nem fodendo
é irretorquível, e liquida o assunto.
Te libera, com a consciência tranqüila,
para outras atividades
de maior interesse em sua vida.
Aquele filho pentelho de 17 anos
te atormenta pedindo o carro
pra ir surfar no litoral?
Não perca tempo nem paciência.
Solte logo um definitivo:
Marquinhos presta atenção, filho querido,
Nem fodendo!.
O impertinente se manca na hora!
Por sua vez,
o porra nenhuma!
atendeu tão plenamente as situações
onde nosso ego exigia
não só a definição de uma negação,
mas também o justo escárnio
contra descarados blefes,
que hoje é totalmente impossível imaginar
que possamos viver sem ele
em nosso cotidiano profissional:
ele redigiu aquele relatório sozinho
porra nenhuma!.
O porra nenhuma,
como vocês podem ver,
nos provê sensações
de incrível bem estar interior.
É como se estivéssemos
fazendo a tardia e justa denúncia pública
de um canalha.
São dessa mesma gênese os clássicos
aspone, chepone, repone
e mais recentemente, o prepone
- presidente de porra nenhuma.
Há outros palavrões igualmente clássicos.
Pense na sonoridade de um
Puta-que-pariu!,
ou seu correlato
Puta-que-o-pariu!,
falado assim, cadenciadamente,
sílaba por sílaba...
Diante de uma notícia irritante qualquer
puta-que-o-pariu!
Dito assim te coloca outra vez em seu eixo.
Seus neurônios têm o devido tempo e clima
para se reorganizar e sacar a atitude
que lhe permitirá dar um merecido troco
ou o safar de maiores dores de cabeça.
E o que dizer de nosso famoso
vai tomar no cu!?
E sua maravilhosa e reforçadora derivação vai
tomar no olho do seu cu!.
Você já imaginou o bem
que alguém faz a si próprio
e aos seus quando,
passado o limite do suportável,
se dirige ao canalha de seu interlocutor
e solta:
Chega!
Vai tomar no olho do seu cu!.
Pronto,
você retomou as rédeas de sua vida,
sua auto-estima.
Desabotoa a camisa e sai a rua,
vento batendo na face,
olhar firme, cabeça erguida,
um delicioso sorriso de vitória
e renovado amor íntimo nos lábios.
E seria tremendamente injusto
não registrar aqui
a expressão de maior poder de definição
do Português Vulgar:
Fodeu!.
E sua derivação mais avassaladora ainda:
Fodeu de vez!.
Você conhece definição mais exata,
pungente e arrasadora
para uma situação
que atingiu o grau máximo imaginável
de ameaçadora complicação?
Expressão, inclusive, que uma vez proferida
insere seu autor
em todo um providencial contexto interior
de alerta e autodefesa.
Algo assim como quando você está dirigindo bêbado,
sem documentos do carro
e sem carteira de habilitação
e ouve uma sirene de polícia atrás de você mandando você parar:
O que você fala?
Fodeu de vez!.
Liberdade, igualdade, fraternidade e
foda-se!
sábado, 31 de março de 2012
Millôr Fernandes
Uma imagem vale por mil palavras diz o provérbio chinês...mas como exprimir essa idéia não fosse a palavra
Millôr Fernandes - 1989
Millôr Fernandes - 1989
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