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sexta-feira, 26 de abril de 2013

Satélite - Manuel Bandeira

Satélite

Fim de tarde.
No céu plúmbeo
A lua baça

Paira.

Muito cosmograficamente
Satélite.

Desmetaforizada,
Desmitificada,

Despojada do velho segredo de melancolia,
Não é agora o golfão de cismas,
O astro dos loucos e enamorados,
Mas tão somente
Satélite.

Ah! Lua deste fim de tarde,
Desmissionária de atribuições românticas;
Sem show para as disponibilidades sentimentais!

Fatigado de mais-valia,
gosto de ti, assim:
Coisa em si,
-Satélite.


Manuel Bandeira

2013. Fotografia © Leonora Fink

2013. Fotografia © Leonora Fink

2013. Fotografia © Leonora Fink

2013. Fotografia © Leonora Fink

2013. Fotografia © Leonora Fink

sábado, 30 de março de 2013

Manuel Bandeira

O que eu adoro em ti 
Não é a tua beleza 
A beleza é em nós que existe 
A beleza é um conceito 
E a beleza é triste 
Não é triste em si 
Mas pelo que há nela 
De fragilidade e incerteza 

O que eu adoro em ti 
Não é a tua inteligência 
Não é o teu espírito sutil 
Tão ágil e tão luminoso 
Ave solta no céu matinal da montanha 
Nem é a tua ciência 
Do coração dos homens e das coisas. 

O que eu adoro em ti 
Não é a tua graça musical 
Sucessiva e renovada a cada momento 
Graça aérea como teu próprio momento 
Graça que perturba e que satisfaz 

O que eu adoro em ti 
Não é a mãe que já perdi 
E nem meu pai 

O que eu adoro em tua natureza 
Não é o profundo instinto matinal 
Em teu flanco aberto como uma ferida 
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza. 

O que adoro em ti lastima-me e consola-me: 
O que eu adoro em ti é a vida!


Manuel Bandeira

terça-feira, 8 de maio de 2012

Manuel Bandeira

O rio

Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas no céu, refleti-las
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranquilas.

Manuel Bandeira

terça-feira, 27 de março de 2012

Manuel Bandeira - O rio

O rio
Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas no céu, refleti-las
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranquilas.

Manuel Bandeira

sexta-feira, 2 de março de 2012

Manuel Bandeira - Ubiquidade

Estás em tudo que penso, 
Estás em quanto imagino;
Estás no horizonte imenso, 
Estás no grão pequenino. 
Estás na ovelha que pasce, 
Estás no rio que corre;
Estás em tudo que nasce,
Estás em tudo que morre.
Em tudo estás, nem repousas,
Ó ser tão mesmo e diverso!
( Eras no início das cousas,
Serás no fim do universo.)
Estás na alma e nos sentidos.
Estás no espírito, estás
Na letra, e, os tempos cumpridos,
No céu, no céu estarás. 



Manuel Bandeira - Ubiquidade

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Carta a Manuel Bandeira, 1929 - por Mário de Andrade

Monólogo


Oh não! muito obrigado!
Pra depois outro e mais outro...
Basta o que me vai por dentro,
Amargo de alma de moço
Deste século safado.
Cigarro? Para que cigarro?
Basta Mussolini, Trotsky,
A Neoescolástica, Freud,
Crise, mulheres, cinema
E a p... que te pariu.
Não insista mais, ouviu?
Sou desgraçado. Não fumo.



O engraçado é que eu fumo e muito. Mas o poema é sinceríssimo.

Carta a Manuel Bandeira, 1929 - Mário de Andrade




quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Manuel Bandeira - O rio

O rio
Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas no céu, refleti-las
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranquilas.

 Manuel Bandeira

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Estrela da Manhã - Manuel Bandeira

Estrela da Manhã 
Manuel Bandeira 


Eu queria a estrela da manhã
Onde está a estrela da manhã?
Meus amigos meus inimigos
Procurem a estrela da manhã

Ela desapareceu ia nua
Desapareceu com quem?
Procurem por toda à parte

Digam que sou um homem sem orgulho
Um homem que aceita tudo
Que me importa?
Eu quero a estrela da manhã

Três dias e três noites
Fui assassino e suicida
Ladrão, pulha, falsário

Virgem mal-sexuada
Atribuladora dos aflitos
Girafa de duas cabeças
Pecai por todos pecai com todos

Pecai com malandros
Pecai com sargentos
Pecai com fuzileiros navais
Pecai de todas as maneiras
Com os gregos e com os troianos
Com o padre e o sacristão
Com o leproso de Pouso Alto
Depois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas
comerei terra e direi coisas de uma ternura tão simples
Que tu desfalecerás

Procurem por toda à parte
Pura ou degradada até a última baixeza
Eu quero a estrela da manhã.




quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Manuel Bandeira - Bembelelém Viva Belém!

Manuel Bandeira - Bembelelém Viva Belém!




Bembelelém
Viva Belém!
Belém do Pará porto moderno integrado na equatorial
Beleza eterna da paisagem
Bembelelém
Viva Belém!
Cidade pomar
(Obrigou a polícia a classificar um tipo novo de delinqüente.
O apedrejador de mangueiras)
Bembelelém
Viva Belém!
Belém do Pará onde as avenidas se chamam Estradas:
Estrada de São Jerônimo
Estrada de Nazaré
Onde a banal Avenida Marechal Deodoro da Fonseca de todas as cidades do Brasil
Se chama liricamente
Brasileiramente
Estrada do Generalíssimo Deodoro
Bembelelém
Viva Belém!
Nortista gostosa
Eu te quero bem.
Terra da castanha
Terra da borracha
Terra de biriba, bacuri, sapoti
Terra de fala cheia de nome indígena
Que a gente não sabe se é de fruta pé de pau ou ave de plumagem bonita.
Nortista gostosa
Eu te quero bem.
Me obrigarás a novas saudades
Nunca mais me esquecerei do teu Largo da Sé
Com a fé maciça das duas maravilhosas igrejas barrocas
E o renque ajoelhado de sobradinhos coloniais tão bonitinhos
Nunca mais me esquecerei
Das velas encarnadas
Verdes
Azuis
Da doca de Ver-o-Peso
Nunca mais
E foi pra me consolar mais tarde
Que inventei esta cantiga:
Bembelelém
Viva Belém!
Nortista gostosa
Eu te quero bem

Manuel Bandeira

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Manuel Bandeira - Madrigal melancólica

‎Madrigal Melancólica
O que eu adoro em ti
Não é sua beleza
A beleza é em nós que existe
A beleza é um conceito
E a beleza é triste
Não é triste em si
Mas pelo que há nela
De fragilidade e incerteza
O que eu adoro em ti
Não é a tua inteligência
Mas é o espírito sutil
Tão ágil e tão luminoso

domingo, 14 de agosto de 2011

Manuel Bandeira - O Bicho

O Bicho


Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.


Manuel Bandeira




domingo, 9 de janeiro de 2011

Poesia - Manuel Bandeira

Poesia - Manuel Bandeira


Quando estás vestida, 
Ninguém imagina 
Os mundos que escondes 
Sob as tuas roupas. 

(Assim, quando é dia,
Não temos noção
Dos astros que luzem
No profundo céu.

Mas a noite é nua,
E, nua na noite,
Palpitam teus mundos
E os mundos da noite.

Brilham teus joelhos,
Brilha o teu umbigo,
Brilha toda a tua
Lira abdominal.

Teus exíguos
- Como na rijeza
Do tronco robusto
Dois frutos pequenos –
Brilham.)

Ah, teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!

Se nua, teus olhos
Ficam nus também:
Teu olhar, mais longe,
Mais lento, mais líquido.

Então, dentro deles,
Bóio, nado, salto
Baixo num mergulho
Perpendicular.

Baixo até o mais fundo
De teu ser, lá onde
Me sorri tu’alma
Nua, nua, nua...

(Manuel Bandeira)






terça-feira, 2 de novembro de 2010

Manuel Bandeira - ODE NO CINQUENTENÁRIO DO POETA BRASILEIRO

ODE NO CINQUENTENÁRIO DO POETA BRASILEIRO

Esse incessante morrer
que nos teus versos encontro
é tua vida, poeta,
e por ele te comunicas
com o mundo em que te esvais.

Debruço-me em teus poemas
e nelo percebo as ilhas
em que nem tu nem nós habitamos
(ou jamais habitaremos!)
e nessas ilhas me banho
num sol que não é dos trópicos,
numa água que não é das fontes
mas que ambos refletem a imagem
de um mundo
amoroso e patético.

Tua violenta ternura,
tua infinita polícia,
tua trágica existência
no entanto sem nenhum sulco
exterior – salvo tuas rugas,
tua gravidade simples,
a acidez e o carinho simples
que desbordam em teus retratos,
que capturo em teus poemas,
são razões por que te amamos
e por que nos fazes sofrer…

Certamente não sabias
que nos fazes sofrer.

É didícil explicar
esse sofrimento seco,
sem qualquer lágrima de amor,
sentiment de homens juntos,
que se comunicam sem gesto
e sem palavras se invadem,
se aproximam, se compreendem
e se calam sem orgulho.

Não é o canto da andorinha, debruçada nos telhados da Lapa,
anunciando que a tua vida passou à toa, à toa.
Não é o médico mandando exclusivamente tocar um tango argentino,
diante da escavação no pulmão esquerdo e do pulmão direito infiltrado.
Não são os carvoeirinhos raquíticos voltando encarapitados nos burros velhos.
Não são os mortos do recife dormindo profundamente na noite.
Nem é tua vida, nem a vida do major veterano da guerra do Paraguai,
a de Bentinho Jararaca
ou a de Christina Georgina Rossetti:
és tu mesmo, é tua poesia,
tua pungengente, inefável poesia,
ferindo as almas, fogo celeste, ao visitá-las;
é o fenômeno poético, de que te constituíste o misterioso portador
e que vem trazer-nos na aurora o sopro quente dos mundos, das armadas exuberantes
e das situaçãoes exemplares que não suspeitávamos.

Por isso sofremos: pela mensagem que nos confias
entre ônibus, abafada pelo pregão dos jornais e mil queixas operárias;
essa insistente mas discreta mensagem
que, aos cinquenta anos, poeta, nos trazes;
e essa fidelidade a ti mesmo com que nos apareces
sem uma queixa, no rosto entretanto experiente,
mão firme estendida para o aperto fraterno

- o poeta acima da guerra e do ódio entre os homens -,
o poeta ainda capaz de amar Esmeraldas embora a alma anoiteça,
o poeta melhor que nós todos, o poeta mais forte
- mas haverá lugar para a poesia?

Efetivamente o poeta Rimbaud fartou-se de escrever,
o poeta Maiakovski suicidou-se,
o poeta Schmidt abastece de água o Distrito Federal…
Em meio a palavras melancólicas,
ouve-se o surdo rumor de combates longínquos
(cada vez mais perto, mais, daqui a pouco dentro de nós).
E enquanto homens suspiram, combatem ou simplesmente ganham dinheiro,
ninguém perecebe que o poeta faz cinquenta anos,
que o poeta permanece o mesmo, embora alguma coisa de extraordinário se houvesse passado,
alguma coisa encoberta de nós, que nem os olhos traíram nem as mãos apalparam, susto, emoção, enternecimento,
desejo de dizer: Emanuel, disfarçado na meiguice elática doa abraços,e uma confiança maior no poeta
e um pedido lancinante para que não nos deixe sozinhos nesta cidade em que nos sentimos pequenos à espera dos maiores acontecimentos.





"Que o poeta nos encaminhe e nos proteja
e que o seu canto confidencial ressoe para consolo de muitos e esperança de todos,
os delicados e os oprimidos, acima das profissões e dos vãos disfarces do homem.
Que o poeta Manuel Bandeira escute este apelo de um homem humilde." por Joca Libânio