TRADUZIR-SE
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?
Ferreira Gullar
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segunda-feira, 6 de janeiro de 2014
sábado, 9 de junho de 2012
Há muitas noites na noite - Poema Sujo Ferreira Gullar
Há muitas noites na noite - Poema Sujo Ferreira Gullar
http://www.youtube.com/watch?v=jAQohkzRUKo&feature=share
quarta-feira, 2 de maio de 2012
Poema Sujo - Ferreira Gullar - Jogo de Idéias
Poema Sujo - Ferreira Gullar - Jogo de Idéias
http://www.youtube.com/watch?v=Vp6bg4PZTe8&feature=share
http://www.youtube.com/watch?v=Vp6bg4PZTe8&feature=share
domingo, 22 de abril de 2012
Ferreira Gullar
Uma parte de mim é todo mundo: outra parte é ninguém: fundo sem fundo. Uma parte de mim é multidão: outra parte estranheza e solidão. Uma parte de mim pesa, pondera: outra parte delira.
Ferreira Gullar
Ferreira Gullar
sábado, 31 de março de 2012
Ferreira Gullar - Subversiva
Subversiva
A poesia
Quando chega
Não respeita nada.
Nem pai nem mãe.
Quando ela chega
De qualquer de seus abismos
Desconhece o Estado e a Sociedade Civil
Infringe o Código de Águas
Relincha
Como puta
Nova
Em frente ao Palácio da Alvorada.
E só depois
Reconsidera: beija
Nos olhos os que ganham mal
Embala no colo
Os que têm sede de felicidade
E de justiça.
E promete incendiar o país.
Ferreira Gullar
A poesia
Quando chega
Não respeita nada.
Nem pai nem mãe.
Quando ela chega
De qualquer de seus abismos
Desconhece o Estado e a Sociedade Civil
Infringe o Código de Águas
Relincha
Como puta
Nova
Em frente ao Palácio da Alvorada.
E só depois
Reconsidera: beija
Nos olhos os que ganham mal
Embala no colo
Os que têm sede de felicidade
E de justiça.
E promete incendiar o país.
Ferreira Gullar
Ferreira Gullar
No corpo
De que vale tentar reconstruir com palavras
O que o verão levou
Entre nuvens e risos
Junto com o jornal velho pelos ares
O sonho na boca, o incêndio na cama,
o apelo da noite
Agora são apenas esta
contração (este clarão)
do maxilar dentro do rosto.
A poesia é o presente.
Ferreira Gullar
De que vale tentar reconstruir com palavras
O que o verão levou
Entre nuvens e risos
Junto com o jornal velho pelos ares
O sonho na boca, o incêndio na cama,
o apelo da noite
Agora são apenas esta
contração (este clarão)
do maxilar dentro do rosto.
A poesia é o presente.
Ferreira Gullar
terça-feira, 10 de janeiro de 2012
Texto - Ferreira Gullar
Como dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
embora o pão seja caro
e a liberdade pequena
Como teus olhos são claros
e a tua pele, morena
como é azul o oceano
e a lagoa, serena
como um tempo de alegria
por trás do terror me acena
e a noite carrega o dia
no seu colo de açucena
– sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade, pequena.
Ferreira Gullar
sei que a vida vale a pena
embora o pão seja caro
e a liberdade pequena
Como teus olhos são claros
e a tua pele, morena
como é azul o oceano
e a lagoa, serena
como um tempo de alegria
por trás do terror me acena
e a noite carrega o dia
no seu colo de açucena
– sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade, pequena.
Ferreira Gullar
terça-feira, 27 de dezembro de 2011
quarta-feira, 21 de dezembro de 2011
Ferreira Gullar - Em alguma parte alguma
(...)
o poeta inventa
o que dizer
e que só
ao dizê-lo
vai saber
o que
precisava dizer
Ferreira Gullar - Em alguma parte alguma
o poeta inventa
o que dizer
e que só
ao dizê-lo
vai saber
o que
precisava dizer
Ferreira Gullar - Em alguma parte alguma
segunda-feira, 19 de dezembro de 2011
PRECONCEITO CULTURAL - Ferreira Gullar
`PRECONCEITO CULTURAL´ ( Ferreira Gullar )
Cruz e Souza e Machado de Assis foram herdeiros de tendências europeias; não se pode afirmar que faziam 'literatura negra'
De alguns anos para cá, passou-se a falar em literatura negra brasileira para definir uma literatura escrita por negros ou mulatos. Tenho dúvidas da pertinência de uma tal designação. E me lembrei de que, no campo das artes plásticas, em começos do século 20, falava-se de escultura negra, mas, creio eu, de maneira apropriada.
Naquele momento, a arte europeia questionava o caráter imitativo da linguagem plástica e descobria que as formas têm expressão autônoma, independentemente do que representem, ou seja, não é necessário que uma escultura imite um corpo de mulher para ter expressão estética, para ser arte.
As esculturas africanas, trazidas para a Europa pelos antropólogos, eram tão "modernas" quanto as dos artistas europeus de vanguarda, já que fugiam a qualquer imitação anatômica. Foram chamadas de arte negra não apenas porque as pessoas que as faziam eram da raça negra e, sim, porque constituíam uma expressão própria a sua cultura.
Não é o caso da literatura. A contribuição do negro à cultura brasileira é inestimável, a tal ponto que falar de contribuição é pouco, uma vez que ela é constitutiva dessa cultura.
O Brasil não seria o país que o mundo conhece -e que nós amamos- sem a música que tem, sem a dança que tem, criada em grande parte pelos negros.
Ninguém hoje pode imaginar este país sem os desfiles de escolas de samba, sem a dança de suas passistas, o ritmo de sua bateria, a beleza e euforia que fascinam o mundo inteiro.
Uma parte dessas manifestações artísticas é também dos brancos, mas constituem, no seu conjunto, uma expressão nova no mundo, nascida da fusão dos muitos elementos de nossa civilização mestiça.
Certamente, os estudiosos reconhecem que, sem o negro e sua criatividade, seu modo próprio de encarar a vida e mudá-la em festa e beleza, não seríamos quem somos. Mas teria sentido, agora, pretender separar, no samba, na dança, no Carnaval, o que é negro do que não é? E já imaginou se, diante disso, surgissem outros para definir, em nosso samba, o que é branco e o que é negro?
E, em função disso, se iniciasse uma disputa para saber quem mais contribuiu, se Pixinguinha ou Tom Jobim, se Ataulfo Alves ou Noel Rosa, se Cartola ou Chico Buarque?
Felizmente, isso não vai acontecer, mesmo porque, nesse terreno, ninguém se preocupa em distinguir música negra de música branca. O que há é música brasileira.
Mas, infelizmente, na literatura, essa descriminação começa a surgir. Não acredito que vá muito longe, uma vez que é destituída de fundamento, mas, de qualquer maneira, contribuirá para criar confusão.
Falar de literatura brasileira negra não tem cabimento. Os negros, que para cá vieram na condição de escravos, não tinham literatura, já que essa manifestação não fazia parte de sua cultura.
Consequentemente, foi aqui que tomaram conhecimento dela e, com os anos, passaram a cultivá-la.
Se é verdade que, nas condições daquele Brasil atrasado de então, a vasta maioria dos escravos nem sequer aprendia a ler -e não só eles, como também quase o povo todo-, com o passar dos séculos e as mudanças na sociedade brasileira, alguns de seus descendentes, não apenas aprenderam a ler como também se tornaram grandes escritores, tal é o caso de Cruz e Souza, Machado de Assis e Lima Barreto, para ficarmos nos mais célebres.
Cruz e Souza era negro; Machado de Assis, mulato, mas tanto um quanto outro foram herdeiros de tendências literárias europeias, fazendo delas veículo de seu modo particular de sentir e expressar a vida. Não se pode, portanto, afirmar que faziam "literatura negra" por terem negra ou parda a cor da pele.
Pode ser que os que falam em literatura negra pretendam valorizar a contribuição do negro à literatura brasileira. A intenção é boa, mas causa estranheza, já que o Brasil inteiro reconhece Machado de Assis como o maior escritor brasileiro de todos os tempos, Pelé como um gênio do futebol e Pixinguinha, um gênio da música.
Contra toda evidência, afirmam que só quando se formar no Brasil um grande público afrodescendente os escritores negros serão reconhecidos, como se só quem é negro tivesse isenção para gostar de literatura escrita por negros. Dizer isso ou é tolice ou má-fé.
(*) Folha de São Paulo (04/12/2011)
Cruz e Souza e Machado de Assis foram herdeiros de tendências europeias; não se pode afirmar que faziam 'literatura negra'
De alguns anos para cá, passou-se a falar em literatura negra brasileira para definir uma literatura escrita por negros ou mulatos. Tenho dúvidas da pertinência de uma tal designação. E me lembrei de que, no campo das artes plásticas, em começos do século 20, falava-se de escultura negra, mas, creio eu, de maneira apropriada.
Naquele momento, a arte europeia questionava o caráter imitativo da linguagem plástica e descobria que as formas têm expressão autônoma, independentemente do que representem, ou seja, não é necessário que uma escultura imite um corpo de mulher para ter expressão estética, para ser arte.
As esculturas africanas, trazidas para a Europa pelos antropólogos, eram tão "modernas" quanto as dos artistas europeus de vanguarda, já que fugiam a qualquer imitação anatômica. Foram chamadas de arte negra não apenas porque as pessoas que as faziam eram da raça negra e, sim, porque constituíam uma expressão própria a sua cultura.
Não é o caso da literatura. A contribuição do negro à cultura brasileira é inestimável, a tal ponto que falar de contribuição é pouco, uma vez que ela é constitutiva dessa cultura.
O Brasil não seria o país que o mundo conhece -e que nós amamos- sem a música que tem, sem a dança que tem, criada em grande parte pelos negros.
Ninguém hoje pode imaginar este país sem os desfiles de escolas de samba, sem a dança de suas passistas, o ritmo de sua bateria, a beleza e euforia que fascinam o mundo inteiro.
Uma parte dessas manifestações artísticas é também dos brancos, mas constituem, no seu conjunto, uma expressão nova no mundo, nascida da fusão dos muitos elementos de nossa civilização mestiça.
Certamente, os estudiosos reconhecem que, sem o negro e sua criatividade, seu modo próprio de encarar a vida e mudá-la em festa e beleza, não seríamos quem somos. Mas teria sentido, agora, pretender separar, no samba, na dança, no Carnaval, o que é negro do que não é? E já imaginou se, diante disso, surgissem outros para definir, em nosso samba, o que é branco e o que é negro?
E, em função disso, se iniciasse uma disputa para saber quem mais contribuiu, se Pixinguinha ou Tom Jobim, se Ataulfo Alves ou Noel Rosa, se Cartola ou Chico Buarque?
Felizmente, isso não vai acontecer, mesmo porque, nesse terreno, ninguém se preocupa em distinguir música negra de música branca. O que há é música brasileira.
Mas, infelizmente, na literatura, essa descriminação começa a surgir. Não acredito que vá muito longe, uma vez que é destituída de fundamento, mas, de qualquer maneira, contribuirá para criar confusão.
Falar de literatura brasileira negra não tem cabimento. Os negros, que para cá vieram na condição de escravos, não tinham literatura, já que essa manifestação não fazia parte de sua cultura.
Consequentemente, foi aqui que tomaram conhecimento dela e, com os anos, passaram a cultivá-la.
Se é verdade que, nas condições daquele Brasil atrasado de então, a vasta maioria dos escravos nem sequer aprendia a ler -e não só eles, como também quase o povo todo-, com o passar dos séculos e as mudanças na sociedade brasileira, alguns de seus descendentes, não apenas aprenderam a ler como também se tornaram grandes escritores, tal é o caso de Cruz e Souza, Machado de Assis e Lima Barreto, para ficarmos nos mais célebres.
Cruz e Souza era negro; Machado de Assis, mulato, mas tanto um quanto outro foram herdeiros de tendências literárias europeias, fazendo delas veículo de seu modo particular de sentir e expressar a vida. Não se pode, portanto, afirmar que faziam "literatura negra" por terem negra ou parda a cor da pele.
Pode ser que os que falam em literatura negra pretendam valorizar a contribuição do negro à literatura brasileira. A intenção é boa, mas causa estranheza, já que o Brasil inteiro reconhece Machado de Assis como o maior escritor brasileiro de todos os tempos, Pelé como um gênio do futebol e Pixinguinha, um gênio da música.
Contra toda evidência, afirmam que só quando se formar no Brasil um grande público afrodescendente os escritores negros serão reconhecidos, como se só quem é negro tivesse isenção para gostar de literatura escrita por negros. Dizer isso ou é tolice ou má-fé.
(*) Folha de São Paulo (04/12/2011)
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
VESTÍGIOS - FERREIRA GULLAR
VESTÍGIOS
Onde o morto deitou-se quando vivo (queimado de césio até a medula) na cama de hospital não resta rastro nem resta mesmo a cama os lençóis que o leito foi desfeito e refeito para outros que ali morreram sem deixar marca (pois tudo a lavanderia apaga, menos a memória que vira cimento ferro alumínio tubos de plásticos) mas como mostrar os vestígios da morte os traços do corpo tornado fósforo? (a chama mortiça do câncer a consumi-los)? Pintando-os na tela? como? Arrastando a cama do hospital para o museu de arte moderna? Expondo o corpo do morto? A cama foi desfeita o cadáver inumado o quarto varrido e desinfetado. É mesmo que nada evocá-lo pintado (na tela) daí porque só restou a SIRON imprimir as marcas das mortes ausente e vil No leito de concreto metáfora brutal da vida que explodiu. (FERREIRA GULLAR)
Publico este poema em homenagem à Iramaia Farah, minha querida prima, guerreira amada.
Onde o morto deitou-se quando vivo (queimado de césio até a medula) na cama de hospital não resta rastro nem resta mesmo a cama os lençóis que o leito foi desfeito e refeito para outros que ali morreram sem deixar marca (pois tudo a lavanderia apaga, menos a memória que vira cimento ferro alumínio tubos de plásticos) mas como mostrar os vestígios da morte os traços do corpo tornado fósforo? (a chama mortiça do câncer a consumi-los)? Pintando-os na tela? como? Arrastando a cama do hospital para o museu de arte moderna? Expondo o corpo do morto? A cama foi desfeita o cadáver inumado o quarto varrido e desinfetado. É mesmo que nada evocá-lo pintado (na tela) daí porque só restou a SIRON imprimir as marcas das mortes ausente e vil No leito de concreto metáfora brutal da vida que explodiu. (FERREIRA GULLAR)
Publico este poema em homenagem à Iramaia Farah, minha querida prima, guerreira amada.
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