sábado, 21 de abril de 2012

Pablo Neruda

Ode ao amor 

Amor, não tenhamos ilusões.
Na minha idade
já não é possível
enganar ou enganarmo-nos.
Fui, talvez, salteador
de estradas,
mas não me arrependo.
Um profundo minuto,
uma magnólia esgarçada
pelos meus dentes
e a luz da lua opalina.
Pois bem, e o balanço?
A solidão manteve
a sua rede entrelaçada
de frios jasmineiros
e então
a que veio a meus braços
era a rosada rainha das ilhas.
Amor,
mesmo que caia
uma gota
durante toda
a nocturna
primavera
não se engendra o oceano
e eu, solitário e nu,
esperando fiquei.

Mas eis aquela
que passou pelos meus braços
como uma onda,
aquela,
que foi somente um sabor
de fruta vespertina,
subitamente
pestanejou como uma estrela,
ardeu como uma pomba
e na minha pele
senti que ela
se desatava
como a cabeleira duma fogueira.
Amor, tudo foi mais simples
desde aquele dia.
Obedeci às ordens
que o meu olvidado coração ordenava
e enlacei a sua cintura
e solicitei a sua boca
com toda a força dos meus beijos,
como um rei que arrebata
com um exército em fúria
uma pequena torre onde cresce
a açucena selvagem da sua infância.

Por isso, Amor, eu creio
que emaranhado e cruel
pode ser o teu caminho,
mas que regressas
da tua caçada
e quando acendes
novamente o fogo,
como o pão sobre a mesa,
assim, singelamente,
deve estar o que amamos.
Amor, isso me deste.
Quando pela primeira vez
ela veio a meus braços
passou como as águas
numa despenhada primavera.
Hoje
dou-lhe guarida.
São estreitas as minhas mãos pequenas
as órbitas dos meus olhos
para que elas possam receber
o seu tesouro,
a cascata
de infindável luz, o fio de ouro,
o pão da sua fragância
que são singelamente, Amor, a minha vida.



Pablo Neruda



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