sábado, 9 de abril de 2011

Amor, amores - Alma Welt

Amor, amores 

Coleciono amores com carinho
E nunca em pensamento os deserdei
Pois que ao respeitar o que amei
Não me perdi no meio do caminho.

Nenhum só jamais eu reneguei
Incluindo os que me foram infiéis,
Que do balanço d’alma só guardei
Um único amor em mil papéis.

Que importam faltas e fraqueza,
Os erros de pessoa e o sofrimento
Produzido por um doce sentimento?

O amor pouco deve ao ser amado,
Se ingênuo por mistério e natureza
Existe por que assim o quis o Fado.

Alma Welt

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Palavras bonitas em italiano

DOVUNQUE - qualquer lugar

BENZINAIO - "posto de gasolina". Benzina é gasolina.
MAGARI - Deus queira
AMORINO - Cupido

João Negreiros - A única verdade absoluta

A única verdade absoluta

As pessoas quando sentem/
fazem-no com o coração/
é no trajecto p'ra cabeça/
que se perde a informação

Poema do livro "o cheiro da sombra das flores", de João Negreiros, à venda em livrarias e emhttps://www.buknet.pt/?op=pesquisa&pesquisa=jo%E3o+negreiros&t=2

João Negreiros - o amoral da história

o amoral da história

o suor do lavrador faz brotar semente
a semente do lavrador faz brotar suor
na goma da camisa está a importância da cerimónia
na graça da criança está a desculpa para o adulto
a raiva acumulada dá o álibi ao pretexto
perder a razão é comum em momentos de crise
saber estar é circunstancial
viver bem despoleta invejas
voltemos atrás vivamos mal ou finjamos viver mal
estar fora da realidade é a solução para quando a realidade não serve
o que nos serve de lição pode ficar curto nas mangas a outro
um companheiro deve ser um amigo ou pelo menos não ser um inimigo
a verdade é a nossa
ao longo da vida existem momentos em que escolhemos e outros que escolhem para nós
criar é um privilégio
criar é um dever
criar é uma obrigação
criar é
criar pode ser
criar às vezes não é uma característica
dar mérito a quem não o tem é perigoso
dar mérito a quem o tem é difícil
saber o nosso lugar é uma fonte de consumições
não ter lugar pode ser a liberdade
não ter onde ficar é desconfortável
viver na escuridão faz mal aos olhos
olhar para o sol directamente também
roubar é errado
roubar está errado
a gravidade de um roubo depende do que roubamos
de a quem roubamos
de quando roubamos
de como roubamos
de porque roubamos
de se hesitamos antes e se dormimos bem depois
da falta que faz o que foi roubado a quem foi roubado
e da falta que vai fazer a quem rouba
a circunstância de passar a fazer parte do conjunto de pessoas que já roubaram poderá ser também factor de adversidade ou não
a inteligência não anda de mãos dadas com o sucesso para não cair
todos temos um objectivo
uns sabem-no
outros não
há gente que descobre quando já é tarde demais
há gente que sabe que já é tarde demais quando descobre
há gente que sabe mas que não quer descobrir
e há gente que descobre mas que não quer saber
levar um dia de cada vez pode criar-nos dificuldades em fazer planos para o fim-de-semana
estar sempre de pé atrás pode obrigar-nos a coxear
se formos cruéis para os nossos semelhantes os nossos semelhantes serão iguais
se tivermos vergonha das nossas origens vamos ter menos anos de vida
a comunicação é muito importante
falar é importante
falar é mais importante do que falar alto
falar é mais importante do que falar baixo
tocar é muito mais importante do que falar
correr sem sentido às vezes é tão útil como saber para onde se corre sempre
começar bem um projecto ou viagem é melhor que um mau começo mas quase tudo está acometido de reversibilidade
e quase nada está acometido de irreversibilidade
estar atento ao que se passa é muito útil mas pode dar-nos demasiada consciência da nossa impotência
estar apenas atento faz-nos 
amorfos
apolíticos
amorais
amáveis
o estado de atenção deverá ser alimentado por uma constante e genuína vontade de intervir
essa vontade de intervir deverá ser secundada pela intervenção em si
quem quiser viver mais tempo deve evitar confusões
quem quiser viver deve meter-se nelas
fazer o que nos mandam é mau
fazer o que nos pedem pode ser bom
quem só manda é mau
quem só pede quer ser mas não consegue
os desafios servem para falhar
os desafios servem para conseguir
a coragem mede-se com uma régua imaginária que só existe quando o coração bate forte
a boca fica seca e sentimos o desmaio eminente
os heróis são homens
as guerras servem para vender armas a santos
a simplicidade é difícil de atingir só porque ninguém é simples
ninguém quer ser simples
as crianças fazem de conta que não sabem para que os pais se sintam melhor
para que os pais sintam melhor
para que os pais se sintam melhores
os significados são exclusivos de quem os compreende
as relações entre pessoas são a causa principal de grande parte das coisas boas
as relações entre pessoas são a causa principal de grande parte das coisas más
o amor não é uma invenção
se o amor fosse uma invenção funcionava
as histórias não deveriam ter moral
as histórias deveriam ter mensagem
esta história não é uma história
o fim obriga-nos sempre a parar

poema do livro "a verdade dói e pode estar errada" à venda em livrarias e em http://www.saidadeemergencia.com/index.php?page=Books.BookView&book_id=535


quinta-feira, 7 de abril de 2011

Walt Whitman

‎'Now I dismiss myself from impassive women,
I will go stay with her who waits for me, and with those women
that are warm-blooded and sufficient for me,
I see that they understand me and do not deny me,
I see that they are worthy of me, I will be the robust husband
of these women.
They are not one jot less than I am,
They are tanned in face by shining suns and blowing winds,
Their flesh has the old divine suppleness and strength,
They know how to swim, row, ride, wrestle, shoot, run, strike, retreat, advance, resist, defend themselves,
They are ultimate in their own right - they are calm, clear, well-possess'd of themselves.'

Walt Whitman

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Chet Baker e Paul Bley - If I Should Lose You

If I Should Lose You


Billie Holiday, Ella Fitzgerald


If I should lose you
The stars would fall from the sky
If I should lose you
Leaves would wither and die
The birds in May-time - they'd sing a mournful refrain
And I would wander around - hating the sound of rain

With you beside me
The rose would bloom in the snow
With you beside me
No winds of winter would blow

I gave you my love - and I was living a dream
But living would seem - in vain if I
(Hating the rain - if I)
(All is in vain if I)
If I ever lost you

By Robin/Rainger


If I Should Lose You  - Nina Simone


http://www.youtube.com/watch?v=UUCW6n3wyTw&playnext=1&list=PL69BAA95B791C2F2A


Nat King Cole - If I Should Lose You  


http://www.youtube.com/watch?v=2V7OKo3TbUA&feature=related 





Chet Atkins 


http://www.youtube.com/watch?v=GnJXI7MN564&feature=related


Tete Montoliu Trio


http://www.youtube.com/watch?v=o1WGZVYxXkU


Francisco Ybarra Barroso - Gestalt

.
Gestalt
.
...era lua cheia é tudo que sei...
...era redonda, rotunda...
...como uma bunda não sei...
...ria de mim, chacoalhava sem fim...
...nunca de perto beijei liberto...
...seus seios...
...era um sonho sonhado...
...um Blues talvez...
...uma forma disforme ornada não sei...
...era tão bela como fera...
...ela...
...feminino de eu...
...era lua cheia é tudo que sei...
.
...era lua cheia é tudo que sei...
...uma dívida um corte...
...misturado sangrado como lote...
...tudo possível tudo risível...
...nas paredes sólidas dos meus olhos...
...uma perna comprida...
...imagino bem...
...são revelias avessuras e grossuras...
...dançam sempar sempão...
...o tesão...
...entre o nunca e a burca...
.

Imagem - Francisco Ybarra Barroso

Jards Macalé - Farinha do Desprezo

Jards Macalé - Farinha do Desprezo



Já comi muito da farinha do desprezo,
Não, não me diga mais que é cedo,
Hum, quanto tempo amor, quanto tempo tava pronta,
Que tava pronta da farinha do despejo.
Já comi muito da farinha do desprezo.
Não, não me diga mais que é cedo,,
Hum, quanto tempo amor, quanto tempo tava pronta,
Que tava pronta da farinha do despejo.
Me jogue fora que na água do balde eu vou m'embora.
Só vou comer agora da farinha do desejo,
Alimentar minha fome pra que eu nunca me esqueça,
Ah como é forte o gosto da farinha do desprezo,
Só vou comer agora da farinha do desejo.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Leonardo da Vinci

As mais lindas palavras de amor são ditas no silêncio de um olhar. Leonardo da Vinci

Oblivion - Astor Piazzolla

Oblivion - Astor Piazzolla


http://www.youtube.com/watch?v=i5tc57Gmfjw

Paulo Leminsky - HaiKai

HAI 

Eis que nasce completo 
e, ao morrer, morre germe, 
o desejo, analfabeto, 
de saber como reger-me,
ah, saber como me ajeito
para que eu seja quem fui,
eis o que nasce perfeito
e, ao crescer, diminui.

KAI

Mínimo templo
para um deus pequeno,
aqui vos guarda,
em vez da dor que peno,
meu extremo anjo de vanguarda.








João Cabral de Melo Neto - Os Três Mal-Amados

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.

O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.

O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.

Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.

O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.

O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.

O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.

O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.

O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.


João Cabral de Melo Neto







Fotografia Leonora Fink

João Cabral de Mello Neto - Barcaça

BARCAÇA

Ele embarcou numa mulher
(Um dia, foi numa cidade:
a vida cigana de então
pedia porto onde ancorasse.

Em Sevilha matriculou-se:
se nele é meteco, ninguém
habitou mais fundo esse porto
nem o soube do quê ao quem).

Hoje embarcou numa mulher.
Recifense(porto-alegrense), ele a chama barcaça,
que é o barco mais feminino,
é mulher feito barco e casa

Mas nunca fez por anular
o registro da barca antiga:
na barcaça pernambucana(gaúcha)
na proa se lê "Sevilha".

E nela embarcou sem querer
saber o que fazem com ela:
já se carrega pouco açúcar
nas barcaças fêmeas, à vela.

Que importa se vai Norte ou Sul?
Se vai a Goiana ou Barreiros?
Tem o registro de Sevilha
e é sem timão, sem timoneiro

( joao cabral de mello neto - sevilha andando)